Se você acha que só manter em dia o sistema de gestão é sinônimo de baixo risco ambiental, é bom rever seus conceitos lendo este artigo.
Pouca pesquisa tem sido feita para a investigação dos mecanismos em que o clima da organização afeta o comportamento de segurança ambiental. Como esperado, o clima geral de uma organização afeta de forma decisiva na performance de segurança (tanto ocupacional como ambiental). Neste artigo, passaremos a entender o motivo pelo qual empresas que apresentam climas considerados “tóxicos” geralmente possuem maior propensão a ocorrência de eventos ambientais, mesmo com mecanismos de controle sistematizados.
O fator comportamental do indivíduo
Condição óbvia para a segurança ambiental é o princípio da prevenção de acidentes e incidentes. Assim, quaisquer fatores que possam ser identificados antes da ocorrência de acidentes, possuem um grande valor na prática de prevenção. A grande maioria dos eventos ambientais são causados por aspectos comportamentais em que não são resultados de fatores ambientais ou fatores do sistema.
Como as organizações buscam refinar seus sistemas de gestão, elas devem considerar as muitas variáveis que contribuem para o comportamento dos indivíduos dentro do grupo.
Percepções de uma empresa ambientalmente segura passam por a) declarações da liderança sobre a importância do tema; b) resposta das lideranças no tratamento dos eventos; c) quantidade de treinamento específico dispensado ao indivíduo e d) como as práticas seguras são incentivados na empresa.
Percepção de segurança ambiental também é influenciada por fatores como a produtividade, competitividade, o ritmo de trabalho imposto entre outros.
A evidência de pesquisas apoia que a personalidade influencia os comportamentos relacionados a práticas ambientais. Diversas pesquisas aplicam um modelo de cinco fatores de personalidade como fatores influenciadores no comportamento para a segurança e meio ambiente: neuroticismo, extroversão, abertura à experiência, aprovação e consciência.
Embora todos os cinco demonstram ter influência em aspectos variáveis do envolvimento de segurança e envolvimento em acidentes, a conscienciosidade e o neuroticismo (indivíduo que transita entre emoções negativas, como raiva, ansiedade ou depressão) parecem contribuir de forma mais consistente para práticas mais seguras.
A alta consciência mostrou prever comportamentos relacionados à segurança e é explicado pelas características dos indivíduos acima desta dimensão de personalidade que geralmente são categorizados como organizados, metódicos, orientados para o plano e mais propensos a cumprir protocolos. Considerando que aqueles com poucas características caracterizam-se por serem mais descuidados, fáceis de serem distraídos, menos confiáveis e menos propensos a cumprir os procedimentos.
No entanto, os eventos podem ocorrer mesmo quando um funcionário cumpriu as práticas e padrões e, portanto, os próprios acidentes não são uma medida precisa de comportamento.
A partir dessas descobertas, entende-se que os indivíduos que medem mais alto no traço da conscienciosidade mostram comportamentos de trabalho mais seguros e que os indivíduos que medem alta na característica do neuroticismo apresentam comportamentos de trabalho menos seguros.
A pressão por resultados e a cultura de tratar desvios
Estruturar uma análise de eventos ambientais e não correlacionar com a necessidade de performar de uma indústria seria uma falha.
Competitividade significa muitas vezes sacrificar processos e cortar custos profundamente. Não vamos nos aprofundar nas consequências diretas da falta de manutenção de equipamentos ou de investimentos, mas nas relações que estes fatores causam nos indivíduos.
Empresas que possuem uma cultura muito forte de resultados pode incentivar os profissionais a atingirem níveis mais altos de risco, a assumirem posições que normalmente não assumiram.
Com certeza a melhoria contínua pode trazer resultados fantásticos em termos operacionais, mas deve existir uma clara linha dos limites que os profissionais não podem ultrapassar sob pena de aumentar muito o risco ambiental.
Esta linha que não pode ser ultrapassada é em muitos momentos bastante tênue e o seu limite deve ser determinado no equilíbrio entre as consequências da falha em ultrapassar e as repercussões da não execução pela necessidade de validação superior.
Em muitos casos são bastante óbvios os limites frente consequências que possam impactar comunidades vizinhas, que gerem danos graves. Entretanto em algumas situações os impactos podem não ser muito bem conhecidos ou podem ser entendidos como irrelevantes e sofrerem agravamento.
Associado a este ponto, muitas empresas não possuem mecanismos para identificar estas rupturas de limites e trazer para o tratamento (ouvir e tratar), por inexistência de sistematização de coleta e tratamento dos potenciais desvios ou por lacunas na cultura de solução de problemas.
O impacto sobre o indivíduo que recebe feedbacks sobre o tratamento de eventos anteriores, a seriedade com que são tratados os registros e os desdobramentos para evitar a recorrência, são bastante conhecidos.
Indivíduos que relatam desvios e não recebem nenhum tipo de retorno perdem a motivação de realizar novos comunicados pois entende que este tipo de atividade de relato não possui valor caracterizado na cultura da empresa.
O resultado disso tudo é que para muitos gestores os acidentes “aconteceram sem aviso prévio”, o que é uma falha crassa de interpretação do cenário industrial.
Obrigação de fazer versus motivação para fazer
Não temos dúvida que mecanismos sistêmicos para garantir o cumprimento de padrão (compliance) são eficazes para a redução no número de eventos ambientais. E realmente a prática mostra que modelos bem estruturados podem reduzir muito a incidência destes eventos em vários ambientes industriais.
Mecanismos como a identificação de pontos críticos, modos de falha e gravidade associada a sistemas de coleta digitais, rotas de inspeção e uma base de dados robusta são ferramentas fantásticas para reduzir a incidência de eventos ambientais.
Mas não são suficientes para garantir um ambiente de prevenção consistente.
Sistemas de coleta de dados para rotas de inspeção podem sinalizar a realização dos check lists, as frequências. Podemos inclusive, garantir a realização do check no ponto crítico com o uso de GPS ou QR Codes. Todos mecanismos tecnológicos disponíveis não se aproximam dos resultados que são obtidos com a correta motivação por fazer.
A motivação consistente do indivíduo, em um ambiente propício para a prevenção é o principal fator que cobre as falhas dos chamados “sistemas obrigatórios”.
Ambientes empresariais saudáveis, com uma boa conformação de rede tendem a ser mais abertos e trabalhar com este tipo de condição de tratar os desvios. Isto normalmente é devido ao bom nível de abertura e comunicação que estas empresas possuem.
Empresas com climas mais pesados e centralizadores (especialmente empresas em crise), tem maiores dificuldades em alcançar bons níveis de motivação para a prevenção de eventos ambientais.
Entende-se também que um senso de propósito mais aguçado leva a um nível de consciência ambiental mais refinado. Este senso de propósito busca o “por que” estar fazendo a atividade e não o “o que” está fazendo.
Se mesmo com todo o esforço que você está fazendo para manter seus mecanismos de gestão refinados a sua empresa não está conseguindo reduzir o número de eventos e a gravidade deles, pode ser o momento da reflexão.
Por: Alexandre Mater
Founder Partner – Stride Inteligência Ambiental